Hélio Oiticica: 11 obras para compreender sua trajetória
Hélio Oiticica (1937-1980) é um dos artistas contemporâneos brasileiros de maior destaque no país, deixando um legado importante e influências em outros campos da arte, para além das artes plásticas.
Através de seu trabalho é possível compreender a evolução de suas ideias, que ao longo do tempo foram objetivando cada vez mais a inclusão do público, em uma união entre a arte e a vida.
Assim, Hélio contribuiu para uma transformação no universo das artes e para afirmação positiva do povo brasileiro e sua identidade, com uma trajetória artística que marcou as gerações seguintes, tornando-se referência para diversos artistas.
1. Metaesquemas (1957-1958)
Hélio Oiticica inicia sua carreira artística ainda jovem, aos 18 anos, em meados da década de 50 com Grupo Frente, coletivo construtivista que integrava artistas importantes como Ivan Serpa, Lygia Clark e Lygia Pape.
É desse período uma série de composições em que o artista cria formas geométricas com guache em papel cartão, inspirado em artistas modernos, como o Wassily Kandinsky (1866-1944). O projeto foi intitulado posteriormente - na década de 70 - de Metaesquemas.
Nesse trabalho são produzidas formas bidimensionais que sugerem a possibilidade de sair do papel. Assim, notamos uma intenção de superação do espaço da pintura, que com o passar do tempo, de fato ocorre no trabalho de Oiticica.
2. Bilaterais e Relevos espaciais (1959)
Depois de explorar inúmeras possibilidades de composição, forma e fundo nos Metaesquemas, Oiticica passa a construir objetos coloridos que são suspensos por fios invisíveis no espaço, trazendo essas formas, antes bidimensionais, para o ambiente tridimensional. São vários trabalhos, que integram as séries de Bilaterais e de Relevos Espaciais.
A ideia do artista é trazer a forma e a cor para o espaço, tornando possível a percepção de que a cor "vibra" no mesmo ambiente em que o espectador habita enquanto observa de perto as esculturas que flutuam.
3. Grande Núcleo (1960)
A obra Grande Núcleo faz parte de uma série em que Oiticica avança em sua pesquisa sobre a cor, as formas e os suportes da arte.
Aqui o artista cria espaços com placas amarelas por onde o público pode caminhar, interagindo com a composição e criando individualmente suas próprias "cabines".
Dessa forma, entende-se que a interação e a movimentação das pessoas em torno da obra é essencial para que dar sentido ao trabalho.
4. Penetrável PN1 (1960)
No mesmo ano em que investiga o espaço com os Núcleos, Hélio cria também a série Penetráveis, no qual insere a cor ainda mais intensamente no recinto e produz, de fato, cabines coloridas.
Nelas, a cor toma o ambiente, descendo até o chão e convidando o espectador a adentrá-la. Assim, Hélio cria lugares e oferece experiências aos visitantes no sentido de vivenciar a própria cor. Aqui, a prática deixa de ser apenas contemplativa e passa a ser relacional.
5. Bólides (início da década de 60)
Partindo de suas instalações, Oiticica passa a produzir uma série de trabalhos em que constrói caixas contendo materiais diversos.
São recipientes feitos de madeira, vidro ou sacos que possuem compartimentos e carregam vários elementos, como areia, pigmentos, tecidos, terra, água e carvão.
O artista experimenta os materiais, criando uma obra que aguça diversos sentidos, como tato, visão e olfato. Os espectadores podem intervir nas obras, manipulando-as e experimentando novas sensações, sendo guiados por um impulso intuitivo.
Bólide Vidro 5 "Homenagem à Mondrian" (1965), Hélio cria uma estrutura feita de vidro, água colorida e tecidos. Usando as cores primárias (amarelo, vermelho e azul), Hélio presta uma homenagem à Mondrian, um artista moderno que trabalhou intensamente essas cores e foi uma referência para Oiticica.
Assim, nesse trabalho as cores são apresentadas de maneira totalmente diferente, onde é possível manuseá-las através da materialidade dos tecidos.
6. Série Parangolés (meados da década de 60)
As obras mais conhecidas de Hélio Oiticica são os Parangolés, que começaram a ser produzidos em meados dos anos 60.
Os trabalhos são fruto de seu envolvimento com a dança e a música, que se tornam mais intensos depois que o artista passa a frequentar e colaborar com a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, no Rio de Janeiro, em 1964.
Hélio prossegue com seu trabalho investigativo em torno de como as cores se relacionam com o espaço. Entretanto, agora o artista inclui o corpo como suporte, com o intuito de "desintelectualizar" sua arte.
Assim, os parangolés, capas de tecido com cores vibrantes, são vestidos por moradores e dançarinos da Mangueira que interagem com esses objetos e buscam "libertar a cor". As capas são ainda como extensões do próprio corpo, como se não se separassem dele.
Em 2012 foi feito um documentário sobre Hélio Oiticica que conta sua trajetória. No vídeo de divulgação do filme é possível ver um pequeno trecho em que aparecem pessoas brincando com os parangolés e o próprio Oiticica.
7. Bandeira-poema Seja Marginal, Seja Herói (1968)
A obra é uma homenagem a Manoel Moreira, homem negro e periférico, morador da Favela do Esqueleto, no Rio de Janeiro.
Oiticica circulava muito pelas favelas e morros cariocas e construiu uma relação de amizade com muitos moradores desses locais. Um desses conhecidos foi Manoel Moreira.
Conhecido pelo apelido "Cara de Cavalo", Manoel foi acusado de assassinar um policial e passou a ser perseguido por uma das primeiras organizações criminosas formadas por policiais, sendo executado em 1964 com mais de 50 tiros.
Quatro anos depois, portanto, Hélio realiza uma bandeira-poema que traz a imagem de Cara de Cavalo morto e a frase "Seja Marginal, seja Herói".
O trabalho ganhou destaque como um protesto e deu impulso ao que se chamou "marginália" ou "cultura marginal", que permeou as artes brasileiras no final dos anos 60 e começo dos 70.
8. Tropicália (1967)
A obra Tropicália foi uma junção das vivências do artista nas comunidades e toda a bagagem que ele possuía sobre seu conceito de brasilidade com as pesquisas que ele já fazia anteriormente, com a série Penetráveis.
Aqui ele recria um ambiente em que vários elementos sensoriais e conceituais sobre sua ideia de Brasil se mesclam, criando um espaço interligado. Nele, as diversas cabines feitas de madeira se conectam, como é próprio nas favelas e vielas.
Além disso, é possível vivenciar uma experiência labiríntica tendo contato com elementos naturais, como pedras, água, plantas tropicais, textos e músicas. Ao final do trajeto há uma televisão ligada, que sugere a união entre a tecnologia e a simplicidade.
Segundo as palavras do artista:
O ambiente criado era obviamente tropical, como num fundo de chácara e, o mais importante, havia a sensação de que se estaria de novo pisando na terra. Esta sensação sentira eu anteriormente ao caminhar pelos morros, pela favela, e mesmo o percurso de entrar, sair, dobrar pelas 'quebradas' de tropicália, lembra muito as caminhadas pelo morro.
Tropicália foi um trabalho importantíssimo para a cultura do país, estimulando outras linguagens e dando nome inclusive a um movimento nos anos 60, que foi eternizado, sobretudo, na música.
9. Ninhos (1970)
Em 1970 Hélio Oiticica desenvolve o trabalho Ninhos, exposto na mostra Information, feita no Museum of Modern Art - MoMA, em Nova York.
A obra é uma instalação composta de várias cabines que se conectam, transmitindo a ideia de multiplicidade e crescimento, como se fossem células em desenvolvimento.
É nesse período que Oiticica ganha uma bolsa para fazer residência artística em Nova York pela Fundação Guggenheim. Ele permanece lá por oito anos e dá continuidade a seus outros projetos, como os Parangolés e Penetráveis.
10. Penetrável Magic Square nº 5, De Luxe (1977)
Enquanto ainda estava nos EUA, Oiticica cria obras como desdobramentos de processos anteriores. É o caso de Penetrável Magic Square nº 5, De Luxe.
A instalação foi criada com base em maquetes desenvolvidas nos anos 60, cujos projetos só poderiam ser executados em locais públicos.
A ideia de Oiticica era oferecer ao público um local de experiência imaginativa, onde cada pessoa pode criar seu próprio espaço, baseando-se nas proposições de formas e cores que o artista apresenta.
A palavra square, que dá nome à obra, faz alusão ao conceito de quadrado e de praça, em inglês.
A cantora e compositora Adriana Calcanhoto produziu o clipe da música Pelos Ares usando como cenário um exemplar dessa instalação presente no Museu do Açude, no Rio de Janeiro.
No vídeo é possível perceber como a obra de arte dialoga com a canção, transformando-se uma casa imaginária, como sugere a música.
11. Mitos Vadios (1978)
Ao voltar para o Brasil, depois de morar em Nova York em uma espécie de auto-exílio por conta da ditadura militar, Oiticica realiza algumas performances pelas ruas, convidado pelo artista Ivald Granato, em um trabalho chamado Mitos Vadios.
Em uma dela, o artista caminha pelas ruas de São Paulo, mais precisamente na Rua Augusta, vestindo óculos de mergulho, sunga e peruca.
A busca de Hélio era a interação com as pessoas que passavam nas ruas, a inovação e o inesperado.
Hélio Oiticica realiza ainda algumas proposições artísticas nos anos que se seguem, como acontecimentos coletivos nas comunidades cariocas e experimentações em projetos já realizados.
Seu último trabalho foi um evento poético-urbano intitulado Esquenta pr'o Carnaval, junto aos moradores do Morro da Mangueira, em 1980. Foi nesse ano que o artista faleceu, vítima de um AVC, deixando um legado poderoso aos 42 anos.
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