Principais livros e ideias fundamentais de Judith Butler
Judith Butler (1956) é uma filósofa, teórica e acadêmica norte-americana que se tornou uma referência fundamental nos estudos de gênero atuais.
Pertencente à terceira vaga do feminismo, a pensadora pós-estruturalista teve um grande impacto na defesa dos direitos das minorias sexuais. Um nome essencial na teoria de gênero contemporânea, Butler também foi uma das autoras pioneiras da teoria queer.
A obra Problemas de Gênero (1990) questionava os papéis de gênero tradicionais e o binarismo no qual as concepções sociais se baseiam.
Nela, a autora apresenta uma perspectiva não-essencialista, propondo o conceito de performatividade de gênero. Uma grande influência dentro e fora do espaço acadêmico, o trabalho de Butler tem sido celebrado no ativismo LGBT e feminista.
Livros e ideias fundamentais
Butler integra um ponto de viragem para o entendimento do gênero e das identidades não-normativas, desconstruindo os discursos sobre a sexualidade, principalmente a ideia de sexo binário.
Refletindo sobre a diversidade humana, a autora ajudou a desmontar construções e preconceitos sobre sexo, gênero e orientação sexual.
Defensora da subversão das normas e da liberdade individual, Judith Butler questionou as tradições e os papéis sociais limitados que são culturalmente incutidos nos indivíduos.
Enquanto pensadora pós-estruturalista, acredita que a realidade é uma construção alicerçada nos sistemas vigentes (social, cultural, econômico, simbólico, etc.).
É também segundo essa linha que a filósofa pensa as identidades: por exemplo, o conceito de "mulher" não é algo estanque, variando cultural e historicamente.
Considerada uma das autoras inaugurais da teoria queer, Butler teceu considerações importantes sobre as expressões e a performatividade de gênero.
A teórica feminista resume alguns destes conceitos no artigo que publicou na Folha de S. Paulo, em novembro de 2017, depois da sua passagem atribulada pelo Brasil:
A cada um de nós é atribuído um gênero no nascimento, o que significa que somos nomeados por nossos pais ou pelas instituições sociais de certas maneiras.
Às vezes, com a atribuição do gênero, um conjunto de expectativas é transmitido: esta é uma menina, então ela vai, quando crescer, assumir o papel tradicional da mulher na família e no trabalho; este é um menino, então ele assumirá uma posição previsível na sociedade como homem.
No entanto, muitas pessoas sofrem dificuldades com sua atribuição — são pessoas que não querem atender aquelas expectativas, e a percepção que têm de si próprias difere da atribuição social que lhes foi dada.
A dúvida que surge com essa situação é a seguinte: em que medida jovens e adultos são livres para construir o significado de sua atribuição de gênero?
Eles nascem na sociedade, mas também são atores sociais e podem trabalhar dentro das normas sociais para moldar suas vidas de maneira que sejam mais vivíveis.
Os escritos de Judith Butler vieram trazer um novo fôlego à teorização feminista e ao trabalho acadêmico feito em torno das questões LGBTQ.
Nas últimas décadas, os seus pensamentos têm sido citados em inúmeras discussões contemporâneas, como a despatologização das pessoas transgênero e a homoparentalidade.
Problemas de gênero (1990)
Problemas de gênero (Gender Trouble, no original) é um livro bastante inovador, considerado uma das obras fundadoras da teoria queer.
De forma bastante resumida, a teoria defende que as identidades de gênero e as orientações sexuais são construções sociais e que, portanto, esses papéis não estão inscritos na biologia do ser humano.
O livro se encontra dividido em três grandes partes; na primeira, Butler reflete sobre o discurso (e as normas impostas) em torno do gênero e da sexualidade humana.
Pensando o gênero como um construto social, a autora procede ao questionamento das justificações biológicas que estão por trás dos papéis de gênero binários e da norma heterossexual.
Quebrando várias barreiras no pensamento contemporâneo, Butler defende que o nosso gênero não é algo essencialmente biológico, determinado à partida, inerente a nós mesmos. Pelo contrário, trata-se de um conjunto de normas que se estabelecem através da repetição de uma série de rituais.
Esses comportamentos (ou rituais) são incutidos pela sociedade em nós, durante toda a vida. Butler defende que somos forçados, policiados, a repeti-los e reproduzi-los. Se não o fizermos, se subvertermos as normas, corremos o risco da condenação, da exclusão e da violência.
Assim, na segunda parte da obra, a feminista se foca nas experiências das minorias sexuais, colocando o foco (e a desconstrução) no conceito de heteronormatividade.
Nesta passagem, a autora explica de que formas a heterossexualidade surge no discurso dominante (científico e não só) como a única orientação sexual possível. Sem lugar para a diversidade ou para vivências plurais, estes discursos estabelecem a heterossexualidade como a norma, algo que deve ser seguido obrigatoriamente.
Finalmente, na terceira parte da obra, Butler aprofunda as distinções entre sexo biológico e gênero, destacando o caráter performativo deste último.
Para muita gente, Problemas de Gênero foi a resposta contemporânea a O Segundo Sexo, outra obra essencial da teoria feminista. Na verdade, ao propôr que alguém não nasce mulher, "torna-se", Beauvoir já parecia apontar o gênero como algo performativo e socialmente construído.
Corpos que importam (1993)
Apenas 3 anos depois da sua obra mais célebre, Judith Butler publicou Corpos que importam. No livro, a autora aprofunda a teoria em torno da performatividade de gênero, respondendo a críticas e interpretações errôneas do seu trabalho.
Neste sentido, esclarece que essa "performance" não é um ato isolado, único, mas uma estrutura de repetição das normas à qual estamos sujeitos diariamente. A estrutura, no entanto, apresenta possibilidades de transgressão e subversão.
Na obra, a teórica analisa os efeitos dos poderes dominantes nas dimensões materiais da sexualidade humana. Através de várias reflexões e exemplos, a autora demonstra que esses conceitos sociais limitam a liberdade e as vivências dos corpos.
Assim, esses discursos influenciam necessariamente as nossas experiências, determinando, desde o começo, o que é (ou não) considerado uma sexualidade normativa e válida.
Vida precária (2004)
Apesar da sua importância na teorização feminista e queer, Butler também tem se dedicado ao estudo de outras questões primordiais no mundo em que vivemos.
Um exemplo disso é a obra Vida precária, escrita na sequência dos atentados de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos da América.
Os ataques terroristas às Torres Gêmeas e ao Pentágono marcaram profundamente a história e a política internacional, mudando principalmente as vivências dos norte-americanos e as suas relações com os outros países.
Através de cinco ensaios, a autora reflete sobre os efeitos do luto e da perda coletiva, se focando ainda nas medidas sociais e políticas que eles podem gerar.
Aquilo que Butler parece denunciar é a reprodução acrítica da violência, que resulta na perda da consciência da humanidade alheia.
Ideias da filósofa feminista Judith Butler
- "A possibilidade não é um luxo. Ela é tão crucial quanto o pão."
- "Sempre fui feminista. Isso significa que eu me oponho à discriminação das mulheres, a todas as formas de desigualdade baseadas no gênero, mas também significa que exijo uma política que leve em conta as restrições impostas pelo gênero ao desenvolvimento humano."
- "É crucial que resistamos às forças da censura que prejudicam a possibilidade de viver em uma democracia igualmente comprometida com a liberdade e a igualdade."
Quem é Judith Butler
Judith Pamela Butler nasceu no dia 25 de fevereiro de 1956, em Cleveland, Ohio. Descendente de judeus russos e húngaros, Judith nunca chegou a conhecer grande parte da família materna, que foi assassinada durante o Holocausto.
Os seus pais eram judeus praticantes e a jovem recebeu uma educação religiosa, tendo sempre se destacado nos estudos. Por ser argumentativa e conversar demais na escola, a estudante começou a receber aulas de ética.
Embora a medida fosse considerada um castigo, Butler chegou a confessar que adorava as sessões e que elas representaram o seu primeiro contacto com a filosofia.
Mais tarde, a autora começou a frequentar a renomada Universidade de Yale, onde tirou um bacharelato em Artes.
Em 1984, Judith Butler também completou o Doutorado em Filosofia pela mesma universidade. Foi então que a teórica começou a sua vida como professora universitária, lecionando em várias faculdades norte-americanas e tendo também passado uma temporada em Amsterdã, na Holanda.
Militante e ativista pelos direitos LGBTQ, Butler é uma mulher lésbica que vive, há muitos anos, em um relacionamento com Wendy Brown. A teórica feminista e a professora de ciências políticas têm um filho, Isaac.
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