Mulher do Fim do Mundo, de Elza Soares: letra e significado da música
Mulher do Fim do Mundo é uma música de 2015, incluída no primeiro álbum de temas inéditos de Elza Soares, o 34º disco da sua carreira, A Mulher do Fim do Mundo.
Meu choro não é nada além de carnaval
É lágrima de samba na ponta dos pés
A multidão avança como vendaval
Me joga na avenida que não sei qual é
Pirata e Super-Homem cantam o calor
Um peixe amarelo beija minha mão
As asas de um anjo soltas pelo chão
Na chuva de confetes deixo a minha dor
Na avenida deixei lá
A pele preta e a minha paz
Na avenida deixei lá
A minha farra minha opinião
A minha casa minha solidão
Joguei do alto do terceiro andar
Quebrei a cara e me livrei do resto dessa vida
Na avenida dura até o fim
Mulher do fim do mundo
Eu sou e vou até o fim cantar
Meu choro não é nada além de carnaval
É lágrima de samba na ponta dos pés
A multidão avança como vendaval
Me joga na avenida que não sei qual é
Pirata e Super-Homem cantam o calor
Um peixe amarelo beija minha mão
As asas de um anjo soltas pelo chão
Na chuva de confetes deixo a minha dor
Na avenida deixei lá
A pele preta e a minha paz
Na avenida deixei lá
A minha farra minha opinião
A minha casa minha solidão
Joguei do alto do terceiro andar
Quebrei a cara e me livrei do resto dessa vida
Na avenida dura até o fim
Mulher do fim do mundo
Eu sou e vou até o fim cantar
Eu quero cantar até o fim
Me deixem cantar até o fim
Até o fim eu vou cantar
Eu vou cantar até o fim
Eu sou mulher do fim do mundo
Eu vou, eu vou cantar, me deixem cantar até o fim
Até o fim eu vou cantar, eu quero cantar
Eu quero é cantar eu vou cantar até o fim
Eu vou cantar, me deixem cantar até o fim
Análise e interpretação
Na música, a Mulher do Fim do Mundo fala sobre si mesma, conta sua história de superação e sobrevivência em meio ao caos e à euforia, simbolizados pelo Carnaval.
Meu choro não é nada além de carnaval
É lágrima de samba na ponta dos pés
A multidão avança como vendaval
Me joga na avenida que não sei qual é
A primeira estrofe começa por apresentar a estratégia de resistência dessa figura feminina, a transformação do sofrimento em alegria, em celebração. Esta ideia é metaforizada pela imagem da lágrima que se transforma em samba, em dança, na ponta dos pés.
Durante o período do Carnaval, as pessoas ocupam as ruas em multidões, num clima de confusão e festa no qual esta mulher é lançada.
Pirata e Super-Homem cantam o calor
Um peixe amarelo beija minha mão
As asas de um anjo soltas pelo chão
Na chuva de confetes deixo a minha dor
Enunciando as fantasias dos presentes – "Pirata", "Super-Homem", "peixe amarelo" – , a segunda estrofe descreve a folia que se vive nas ruas. Retrata também um cenário apocalíptico com a imagem das asas de um anjo no chão da avenida.
Com o verso "Na chuva de confetes deixo a minha dor" chega a ideia de catarse, que já se adivinhava na estrofe anterior. O Carnaval surge, assim, como um tempo de libertação, no qual podemos largar o sofrimento.
Na avenida deixei lá
A pele preta e a minha paz
Na avenida deixei lá
A minha farra minha opinião
A minha casa minha solidão
Joguei do alto do terceiro andar
A festividade, celebrada por todo o povo brasileiro, representa uma época do ano em que alguns dos problemas sociais e de discriminação (por exemplo, racial) são colocados em pausa. Juntos, todos caiem na farra, independentemente das injustiças que ocupam os restantes dias do ano.
Na avenida, a mulher não está mais sozinha ("minha solidão / Joguei do alto do terceiro andar”), esquece o isolamento e a dor, se junta à multidão e celebra.
Quebrei a cara e me livrei do resto dessa vida
Na avenida dura até o fim
Mulher do fim do mundo
Eu sou e vou até o fim cantar
Assumindo todas as derrotas que sofreu (“Quebrei a cara”), sublinha que conseguiu suportar e ultrapassar todas as dificuldades (“me livrei do resto dessa vida”). No final, o que resta é ela, forte, a Mulher do Fim do Mundo que assiste ao apocalipse e sobrevive, resiste.
Eu quero cantar até o fim
Me deixem cantar até o fim
Até o fim eu vou cantar
Eu vou cantar até o fim
Eu sou mulher do fim do mundo
Eu vou, eu vou cantar, me deixem cantar até o fim
Até o fim eu vou cantar, eu quero cantar
Eu quero é cantar eu vou cantar até o fim
Eu vou cantar, me deixem cantar até o fim
As últimas estrofes repetem a ideia de que esta mulher quer e vai cantar "até o fim", marcando o seu cansaço mas também a sua teimosia, a sua resiliência em continuar transformando dor em alegria até a vida terminar.
Significado da música
Ainda que a letra da canção seja da autoria de Alice Coutinho e Rômulo Fróes, esta parece estar intimamente ligada à vida de Elza Soares e à mensagem que a cantora quer passar para o mundo.
Com setenta e oito anos de idade, lançou pela primeira vez um disco de temas inéditos: tem a sua própria voz, a oportunidade de contar a sua história.
Mulher negra e empoderada, que sofreu diversos preconceitos e teve que lutar a cada passo do caminho, é sinônimo de força e resistência feminina. Assim, em meio a todo o caos, a Mulher do Fim do Mundo dança por entre os destroços e continua de pé, cantando até ao último momento.
Elza Soares, a Mulher do Fim do Mundo
Elza Soares nasceu no Rio de Janeiro, em 23 de junho de 1937. A vida de pobreza a forçou a trabalhar desde a infância; aos treze anos estava casada. Quando tinha catorze anos, morreu o seu primeiro filho. Aos quinze, morreu o segundo.
Ainda jovem, ficou viúva, criando cinco filhos sozinha e trabalhando como empregada doméstica, ainda que continuasse lutando pelo sonho de ser cantora.
Mesmo quando alcançou a fama, continuou tendo que superar obstáculos como a opinião pública que condenou o seu casamento com o jogador de futebol Garrincha, porque ele tinha se separado da esposa algum tempo antes.
A união entre os dois gerou um filho, mas terminou mal, com episódios de violência do marido alcoolizado e possessivo. Quando o filho de ambos morreu, anos mais tarde, num acidente de viação, Elza entrou numa espiral descendente, tentando até cometer o suicídio.
Mesmo assim, e depois de ultrapassar tantos obstáculos e episódios traumáticos, a alegria de viver de Elza continua sendo notória, agraciando o seu público sempre com um sorriso contagiante.
Com uma carreira de sucesso que dura há várias décadas e tendo sido eleita, pela Rádio BBC de Londres a cantora brasileira do milênio, em 1999, Elza faleceu em 20 janeiro de 2022, aos 91 anos.