Obras de Candido Portinari: 10 quadros analisados
Candido Portinari (1903-1962) foi um dos maiores pintores brasileiros de todos os tempos.
O artista, modernista, recebeu uma série de prêmios nacionais e internacionais e retratou, como ninguém, muito da dura realidade brasileira eternizando imagens como as presentes em Retirantes e Guerra e paz.
1. Retirantes (1944)
A tela mais famosa de Portinari retrata uma família pobre, anônima, composta por vítimas da seca no nordeste brasileiro. O próprio nome escolhido para o quadro - Retirantes - denuncia a condição e fala do anonimato de uma família que representa tantas outras.
Os personagens encontram-se em pele e osso, escurecidos pelo sol, frágeis, vítimas da aridez nordestina. Um dos meninos mais novos apresenta a barriga distendida provocada pelos vermes (chamada também de barriga d'água).
Há um clima fúnebre na imagem ressaltado pelos tons utilizados (cinza, marrom e preto). No chão observamos carcaças, uma paisagem desértica, sem vegetação, com urubus sobrevoando ao fundo que parecem esperar pela morte da família.
O retrato da miséria foi pintado por Portinari em Petrópolis e eterniza aqueles que vivem em condições sub-humanas e precisam emigrar para conseguirem sobreviver.
A tela, que está em exibição no MASP, foi pintada a óleo e mede 190 por 180 cm.
Se quiser uma análise aprofundada da obra mais famosa de Portinari recomendamos o artigo Quadro Retirantes, de Candido Portinari.
2. Guerra e paz (1955)
Em Guerra e paz o pintor faz uso de formas geométricas e linhas retas, empregando personagens sobrepostos e povoando as telas com muitas pessoas.
A leitura da imagem referente à paz e da imagem referente à guerra pode ser feita pela expressão das personagens que vão desde o medo (na guerra) até o alívio (na paz). Os tons usados nas duas representações também são diferentes.
Na guerra, Portinari resolveu inovar e, ao invés de simbolizar o combate através da representação de soldados em batalha, como tradicionalmente era feito, escolheu retratar uma série de imagens do povo em sofrimento.
A encomenda foi feita ao pintor em 1952. A obra enorme (cada painel tem 14 metros de altura por 10 de largura e pesa mais de 1 tonelada) foi um presente do governo brasileiro para a sede da ONU em Nova Iorque.
Guerra e Paz represem sem dúvida o melhor trabalho que já fiz. Dedico-os à humanidade.
Candido Portinari (1957)
Portinari tinha um espaço disponível de 280 metros quadrados para criação e começou o planejamento do seu maior projeto fazendo 180 estudos com desenhos e maquetes. No dia 6 de setembro de 1957 os caixotes com a obra foram oficialmente entregues em cerimônia oficial à ONU.
Guerra e paz pode ser admirado no hall da sede da ONU, em Nova Iorque, e mede 14 metros de altura por 20 metros de largura.
3. O lavrador de café (1934)
Entre os temas mais frequentes de Portinari estavam os trabalhadores rurais nas suas atividades cotidianas. E O lavrador de café é das obras mais consagradas dessa linhagem de produções.
Repare como o pintor destaca as características físicas e a força desse trabalhador do café através da valorização dos membros - os braços e pernas apresentam contornos musculosos, de quem trabalha na lide do campo diariamente.
O protagonista anônimo é um operário do café retratado no seu local de trabalho com a sua ferramenta - a enxada - na mão direita, como se tivesse fazendo uma pausa da lavoura.
Ao invés de olhar para o retratista, porém, o trabalhador desconhecido mira a paisagem. Atrás do seu corpo vemos, ao fundo, a plantação de café.
A tela pintada a óleo encontra-se abrigada no MASP e tem 100 por 81cm.
Para saber mais sobre essa obra, leia: Análise de O lavrador de café, de Candido Portinari
4. Mestiço (1934)
Mestiço é o belo retrato de um homem anônimo, em tronco nu. Pela sua fisionomia, vemos que ele é resultado da mistura dos diferentes povos que compõem a sociedade brasileira. O nome do quadro sublinha, aliás, essa nossa origem híbrida, fruto de diferentes origens (europeus, negros e índios).
O jovem não identificado está provavelmente no seu local de trabalho, ao fundo observamos uma paisagem rural desabitada com plantações e bananeiras. O homem encara o pintor e, consequentemente, o espectador. As suas feições são fechadas, assim como a sua postura corporal imponente, de braços cruzados.
Portinari teve especial atenção nessa pintura para os detalhes, repare como os músculos são torneados e como há uma atenção na sombra, no jogo de luz e até em pormenores como as rugas nos dedos das mãos.
Mestiço é um óleo sobre tela com 81 por 65 cm e pode ser visto na Pinacoteca do Estado de São Paulo.
5. O café (1935)
Portinari foi contemporâneo e testemunhou o período áureo do café no Brasil, muitas das suas telas registram, portanto, esse momento da nossa história.
Além de fazer retratos de trabalhadores individuais, o pintor criou composições como a acima, coletivas, flagrando diferentes momentos da produção no cafezal.
Aqui os pés e as mãos dos trabalhadores são desproporcionais quando comparados ao resto do corpo, isso foi feito intencionalmente pelo pintor, que queria enfatizar a questão da força da mão de obra braçal envolvida nesse tipo de ofício.
A tela O café foi premiada internacionalmente (foi o primeiro prêmio internacional do pintor) depois de ter sido exibida na Exposição Internacional de Arte Moderna em Nova Iorque.
O trabalho é um óleo sobre tela de 130 por 195 cm e faz parte do acervo do Museu Nacional de Belas Artes, no Rio De Janeiro.
6. Criança morta (1944)
Com uma temática e um estilo parecido com Retirantes, a tela Criança morta foi pintada no mesmo ano que a obra mais famosa de Candido Portinari.
Nessa composição o público também é apresentado a uma família que precisa encarar a fome, a miséria e a seca no sertão nordestino.
Vemos ao centro da imagem o cadáver de um membro da família que perdeu a vida, provavelmente devido às condições extremas a que o corpo foi submetido. A alta mortalidade infantil eternizada por Portinari foi relativamente frequente durante um longo período na região norte do Brasil.
No quadro Criança morta todos sofrem a perda e choram, mas o adulto que carrega o corpo nem sequer consegue olhar para a frente, a sua expressão corporal é de absoluto desespero.
Criança morta pode ser admirada pelo público que visita o MASP. A tela, pintada com tinta a óleo, tem 182 por 190 cm.
7. A primeira missa no Brasil (1948)
Candido Portinari tomou a liberdade de fazer uma interpretação livre da primeira missa em solo brasileiro e não se preocupou em se limitar pelos registros históricos daquela que teria sido a primeira celebração no país.
Na sua leitura desse evento, o pintor escolheu abusar de cores vivas fazendo uso de linhas geométricas. A tela foi criada quando esteve no Uruguai, exilado por motivos políticos (Portinari era comunista e foi perseguido pelo governo brasileiro).
A peça foi uma encomenda feita em 1946 por Thomaz Oscar Pinto da Cunha Saavedra para a sede do Banco Boavista (banco que presidia). O quadro, enorme, deveria ficar abrigado na mezzanine de um prédio projetado por Niemeyer situado no centro do Rio de Janeiro.
Em 2013, o trabalho, que passava alheio aos olhos do grande público, foi comprado pelo governo e passou a fazer parte do acervo do Museu Nacional de Belas Artes. O painel tem 2,71 m por 5,01m e foi realizado com tinta a óleo.
8. Paisagem com bananeiras (1927)
Com uma linguagem bastante diferente e pouco conhecida pelo grande público, Paisagem com bananeiras acabou por cair no esquecimento por se distanciar esteticamente do resto do trabalho do pintor brasileiro.
Portinari pintou essa tela ainda no princípio da carreira usando traços simples de modo a retratar uma paisagem rural tipicamente brasileira com bananeiras.
Para dar vida a sua tela fez uso de uma gama de cores mais restrita (passando do azul para o verde e então o tom de terra), optando por uma composição mais lisa e plana.
Na tela não há seres animados - nem homens, nem animais - deixando a vista para o espectador apenas uma bucólica paisagem natural vazia.
O quadro a óleo tem 27 por 22cm e faz parte de uma coleção particular.
9. Baile na roça (1923)
Baile na roça é de suma importância na obra do pintor porque foi a primeira tela com temática nacional. Ela foi criada quando Portinari tinha apenas 20 anos e estava estudando na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
O fundo liso e escuro destaca os personagens - coloridos dançarinos a pares e componentes da banda.
Na imagem encontramos um típico baile popular, de camponeses, da sua cidade, Brodósqui, no interior de São Paulo. Sobre a criação da tela restou um relato, encontrado na correspondência do pintor:
"Quando comecei a pintar senti que devia fazer a minha gente e cheguei a fazer o "baile na Roça"."
A obra que Portinari tanto estimava chegou a ser recusada no Salão Oficial da Escola de Belas Artes de 1924 porque não era compatível com a estética do seu tempo. Frustrado, o jovem resolver partir para outro gênero de pintura, mais dedicada aos retratos acadêmicos.
O trabalho ficou desaparecido por mais de cinquenta anos para tristeza do pintor. Baile na roça é um óleo sobre tela com 97 por 134 cm e pertence a uma coleção particular.
10. Meninos soltando pipa (1947)
Em Meninos soltando pipa vemos quatro meninos celebrando a liberdade, brincando de um passatempo tradicional atemporal - soltando pipa.
Na tela não vemos as expressões das crianças, pela expressão corporal observamos apenas que os meninos correm livremente aproveitando o fim de tarde.
A paisagem lisa e desfocada, é feita em degradê com tons áridos, dando um protagonismo ainda maior aos meninos coloridos com as suas pipas.
Portinari tem alguns outros quadros com o mesmo título e imagens semelhantes e tinha uma certa fixação em retratar crianças brincando, segundo o pintor:
"Sabem por que que eu pinto tanto menino em gangorra e balanço? Para botá-los no ar, feito anjos."
A tela Meninos soltando pipa faz parte de uma coleção particular, é feita a tinta óleo e tem 60 por 74 cm.
Leia também Vida e obra de Candido Portinari e Obras de Lasar Segall para conhecer o artista.