Poema Pneumotorax de Manuel Bandeira (com análise)
Publicado em 1930, no livro Libertinagem, o poema Pneumotórax, uma das obras-primas de Manuel Bandeira (1886-1968), se tornou um clássico do modernismo brasileiro.
Em poucos versos vemos a história do eu-lírico que apresenta problemas pulmonares e não encontra uma saída possível para a solução do seu problema. Com uma dose de humor e ironia, Bandeira termina o seu poema com uma conclusão inesperada.
Poema Pneumotórax na íntegra
Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.……………………………………………………………………….
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não.A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Análise do poema Pneumotórax
Versos iniciais
O poema modernista Pneumotórax se inicia com a enumeração dos sintomas de uma doença que desconhecemos: "Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos".
O verso a seguir faz uma constatação esperada de ser dita por alguém que está no leito de morte. O sujeito olha para trás e reflete sobre o manancial de oportunidades que teve ao longo do seu percurso e que acabou por não aproveitar: "A vida inteira que podia ter sido e que não foi."
Por um breve instante as palavras interrompem as considerações filosóficas do paciente e mostram o regresso dos sintomas: "Tosse, tosse, tosse".
Versos intermediários
Logo a seguir, a meio do poema, o médico é chamado:
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.
O que vemos é o diálogo - bastante realista - entre o médico e o doente. Há aqui a descrição sucinta de um exame clínico: o doutor manda o paciente repetir algumas palavras, ele obedece.
Convém sublinhar que Pneumotórax foi um poema profundamente ligado à biografia de Manuel Bandeira que, ao longo da vida, teve uma série de problemas pulmonares e precisou se submeter a alguns procedimentos.
Versos finais
Depois de um pausa no poema indicada pela pontuação recebemos o diagnóstico, a princípio grave, do paciente. O médico dá então uma descrição bastante fria e objetiva sobre o exame que acabou de fazer: "O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado".
Ele não apresenta soluções, não propõe terapêuticas, apenas indica em termos técnicos o que foi capaz de apurar do exame.
Na linha a seguir é o paciente que sugere uma hipótese de tratamento ("Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?"), demonstrando certo conhecimento médico. Há também o sinal de uma esperança, o leitor é levado a crer pela resposta informada que o paciente já havia passado por situação semelhante antes.
A resposta, seca e direta, é devastadora - "Não" - e não apresenta qualquer possibilidade de saída.
Conclusão
A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
No último verso vemos a ironia ao invés da depressão, constatamos a presença do humor, típica característica da lírica de Bandeira.
No encerramento do poema, o eu-lírico faz uma brincadeira com o seu diagnóstico, que passa a encarar com certa leveza.
Diante do inevitável constatado pelo médico, a conclusão que o sujeito poético chega é que a sua única alternativa é aproveitar o pouco tempo que ainda resta aqui.
Convém sublinhar a escolha do gênero musical escolhido - o tango é um gênero musical tipicamente dramático.
Escute o poema recitado
Contexto de publicação do poema Pneumotórax
O poema Pneumotórax foi publicado na obra Libertinagem, lançada em 1930. O poema que carrega como título o nome técnico de um procedimento médico conta uma história completa, com início, meio e fim.
Fazendo uso de uma linguagem coloquial - assim como no resto da obra - observamos uma lírica extremamente biográfica.
Bandeira, que enfrentou problemas pulmonares ao longo de toda a vida, tinha cinquenta e seis anos quando criou Pneumotórax.
Sobre Manuel Bandeira (1886-1968)
Poeta, jornalista, crítico, escritor, professor - esse foi Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho, conhecido publicamente apenas como Manuel Bandeira.
Nascido no Recife, no dia 19 de abril de 1886, era filho de um engenheiro chamado Manuel Carneiro de Souza Bandeira com Francelina Ribeiro.
Manuel foi criado numa família abastada, composta por proprietários de terra e políticos.
Quando tinha 16 anos se mudou para o Rio de Janeiro. Tentou se formar em Arquitetura, mas teve os estudos interrompidos devido à doenças pulmonares.
Por conta da sua frágil condição de saúde, se mudou para a Suíça para se tratar. Uma curiosidade: lá o nosso poeta brasileiro ficou internado e se tornou amigo do poeta francês Paul Éluard.
De volta ao Brasil, começou a produzir com vigor tendo dado o pontapé inicial na carreira com o lançamento do primeiro livro (A cinza das horas, 1917).
Um dos maiores nomes do Modernismo, Manuel Bandeira participou da Semana de Arte Moderna de 1922 tendo enviado o seu famoso poema Os sapos para ser lido.
Ao longo da carreira, escreveu poemas memoráveis que entraram para o hall de obras-primas da literatura brasileira como: Vou-me embora pra Pasárgada, Evocação ao Recife e Teresa.