Slam: o que é a poesia falada que está ganhando as ruas (com exemplos)

Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes
Tempo de leitura: 6 min.

O slam é uma forma de poesia oral e performática, apresentada numa competição onde os autores declamam seus versos para o público, que escolhe um vencedor.

Seu nome vem do termo inglês que significa "bater", o que traduz a força deste tipo de apresentação e o impacto que tem nos espectadores.

Muitas vezes, os poemas trazem críticas sociais explícitas, narrando as dores e as experiências dos indivíduos, assim como as opressões que os atravessam. Por isso, é considerado um gênero poético de resistência.

Com o propósito de resgatar a poesia dos ambientes acadêmicos e trazê-la para as ruas, pretende dar voz a múltiplas experiências e forças criativas, sobretudo entre os grupos marginalizados.

Além da poesia, o slam tem uma forte componente de performance, dependendo também da expressividade e dos gestos de quem está se apresentando.

O que vai encontrar:

Exemplos de poesia slam

A partir dos anos 2000, o slam começou a se espalhar pelo Brasil, principalmente nas regiões periféricas. Ao longo dos anos, algumas competições se tornaram bastante famosas, como o Slam BR e o Slam das Minas.

Conheça alguns exemplos brasileiros:

Inquietação, Mel Duarte

Inquietações
Tenho observado que é cada vez mais difícil o ser humano se manter convicto de
seus ideais.
Habitamos uma terra fértil infectada por vícios, ganância e intolerância de quem
a conduz.
Tenho lamentado tantas bombas, atentados, golpes de estado, repressões
policiais.
Jogos midiáticos atraem uma plateia de memória falha, suscetível à pior escolha
sem nem fazer ideia do que reproduz!

Eu procuro fincar minhas raízes no que me parece estar submerso precisando
imergir,
tenho dentro do peito esse terreno suspenso que briga com meus receios e isso
me faz progredir.

Mel Duarte é uma poeta e slammer nascida em São Paulo. Participante de vários saraus de poesia e autora de Negra Nua Crua (2016), também foi uma das fundadoras do Slam das Minas, uma competição destinada apenas a slammers femininas.

No trecho que citamos acima, a autora tece diversas críticas à sociedade atual, citando a violência, a ganância e os jogos de poder. Mesmo assim, suas palavras deixam uma mensagem positiva: mesmo em meio ao caos, é preciso evoluir sempre.

Mãos à obra, Kenyt

É pau, é pedra, esse é o caminho
de quem veio do sertão, sem lenço sem documento sozinho
perdido na selva de pedra, acolhido nos barracos de pau
nas ruas de Barro de alguma favela
Infância? não sabe nem o significado dessa palavra
aos 10 anos de idade seu primeiro presente: uma pá e uma enxada

Kenyt é um MC, poeta e ator da zona leste de São Paulo, autor do livro Inté aqui (2022). No trecho apresentado acima, ele traz referências a dois clássicos da música popular brasileira: Águas de Março de Tom Jobim e Alegria, Alegria de Caetano Veloso.

Na composição, narra a vida de um nordestino que precisou se mudar para o meio urbano para sobreviver. Contudo, as condições de vida que encontrou por lá não foram melhores. Trata-se de alguém que, desde criança, conheceu a dureza da vida e foi obrigado a realizar trabalhos pesados.

Através destes versos, o poeta chama a atenção para a exploração, a injustiça e as desigualdades, como uma história que se repete há várias gerações.

Slam Grito Filmes, Gabz

Se pelo menos eu soubesse
Meu verdadeiro sobrenome
Meu país, minha terra
Ah, se eu soubesse, já era
Se minha carne fosse vista diferente
Se seu olhar fosse mais inocente
Se eu não tivesse que ser forte
Nem dependesse da sorte

Gabz é uma atriz, rapper e poeta nascida na Zona Norte do Rio de Janeiro. Em 2017, foi a vencedora do Slam Grito Filmes, com o poema que citamos acima.

Neste trecho, vemos o testemunho de uma mulher negra e periférica, falando de suas vivências no Brasil, na vida cultural e até na cena do slam brasileiro.

História e origem do slam

O slam surgiu em Chicago, nos Estados Unidos, durante a década de 80. Seu idealizador foi Marc Kelly Smith, um poeta e trabalhador da construção civil que costumava participar em saraus locais.

Marc Smith, numa competição de slam em 2009.
Marc Smith, numa competição de slam em 2009. Fotografia por Pierre Lazone.

Por lá, existiam críticas àqueles que apresentavam seus poemas de forma mais teatral, em vez de se limitarem a ler o que escreveram. Isso despertou a ideia de criar um novo formato, com uma componente de performance, que tornasse a poesia mais interativa, libertando-a do ambiente acadêmico e elitista.

Assim, a primeira competição de slam aconteceu em 1986, no bar Green Mill Tavern. Com o tempo, o slam foi se difundindo pelo país e, mais tarde, pelo resto do mundo.

Slam: características e temáticas

As competições de slam acontecem em diversos espaços e ambientes, com regras que podem variar. No entanto, algumas diretrizes e características costumam manter-se em todas:

  • Todos podem competir, independentemente de idade, etnia, gênero, classe social ou outros fatores;
  • Existe um tempo limitado para as apresentações, normalmente entre 3 e 5 minutos. Se esse tempo for ultrapassado, podem existir penalizações;
  • Não é permitido usar adereços, cenários ou figurinos durante as apresentações;
  • Não há acompanhamento de música, mas os slammers podem cantar, bater palmas ou criar outros sons usando o próprio corpo;
  • Apresentações podem ser individuais ou em grupo, mas os textos devem ser originais.

Os temas abordados neste tipo de poesia são inúmeros, já que não existem restrições a esse respeito. No entanto, uma vasta maioria dos slammers escolhe usar sua poesia como um veículo de crítica social, política e cultural.

Deste modo, algumas das temáticas mais comuns envolvem a identidade, as experiências individuais e coletivas e as grandes questões sociais como o racismo, a discriminação de gênero e a exploração da classe trabalhadora.

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Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes e licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Apaixonada por leitura e escrita, produz conteúdos on-line desde 2017, sobre literatura, cultura e outros campos do saber.