Vanguardas europeias: movimentos, principais obras e influências no Brasil

Laura Aidar
Laura Aidar
Arte-educadora, fotógrafa e artista visual
Tempo de leitura: 10 min.

Quando falamos em vanguardas europeias nos referimos a diversos movimentos artísticos que ocorreram no começo do século XX em diferentes países do continente europeu.

Foram vertentes que buscavam uma renovação cultural, apoiando-se na criação artística através de diversas linguagens, sobretudo a pintura.

Integram esse grupo as vanguardas: expressionismo, fauvismo, cubismo, futurismo, dadaísmo e surrealismo, responsáveis por marcar um momento cultural e influenciar a arte que viria a seguir, inclusive em solo brasileiro.

Expressionismo: a representação da angústia

O movimento expressionista ganhou corpo com a criação de um coletivo intitulado Die Brücke (A ponte), idealizado pelos artistas Ernst Kirchner (1880-1938), Erich Heckel (1883-1970) e Karl Schmidt-Rottluff (1884-1976) em 1905 em Dresden, Alemanha.

expressionismo
Rua Dresda (1908), de Ernst Ludwig Kirchner

O grupo tinha como intuito retratar sentimentos intensos, como o medo, a angústia, a ansiedade, a solidão e o desamparo. Por isso, as obras expressionistas têm um caráter pessimista, talvez agressivo e exagerado, com cores contrastantes e pinceladas vigorosas.

Assim, o expressionismo é também um contraponto ao estilo impressionista, positivo e "luminoso", surgido anteriormente.

Artistas importantes para o surgimento da corrente foram Edvard Munch e Vincent Van Gogh, sendo o primeiro considerado precursor da vertente.

Fauvismo: a arbitrariedade cromática

Fauvismo é o nome do movimento que teve como representantes André Derain (1880-1954), Maurice de Vlaminck (1876-1958), Othon Friesz (1879-1949) e Henri Matisse (1869-1954), o mais célebre do grupo.

Nesse estilo de pintura, os artistas buscavam a liberdade na representação das formas e no emprego das cores. As cenas apresentavam figuras simplificadas, nas quais não havia um compromisso com a representação realista.

matisse fauvismo
Harmonia no vermelho (1908), de Henri Matisse

Da mesma forma, o uso cromático era feito de maneira direta, geralmente sem a mescla de pigmentos e degradês. Assim, as obras exibiam cores intensas e puras, empregadas arbitrariamente.

O termo fauvismo é derivado de les fauves, que em francês significa "os feras", ou "os selvagens". O nome foi dado pelo crítico de arte Louis Vauxcelles, que em 1905, visitou o "Salão de Outono", em Paris, e se chocou com as obras desses artistas, apelidando-os pejorativamente de "selvagens".

Matisse foi o mais significativo dos fauvistas, produzindo um trabalho que, posteriormente, influenciaria o design e a moda.

Conheça mais: Fauvismo: características, principais artistas e suas obras mais famosas

Cubismo: a geometrização e fragmentação das figuras

O cubismo é, talvez, a vanguarda artística mais importante desse período. Foi originado a partir da obra de Paul Cézzane (1838-1906), que começou a explorar as formas cilíndricas, esféricas e cônicas.

O movimento teve como expoentes Pablo Picasso (1881-1973) e Georges Braque (1882-1963). Esses artistas tinham como objetivo decompor as figuras, como se as "abrissem" em um único plano. Assim, obviamente também não tinham nenhum compromisso com a representação do real.

Nova York, EUA - 25 de maio de 2018: Multidão de pessoas perto da pintura de Pablo Picasso “Les Demoiselles D‘Avignon” no Museu de Arte Moderna de Nova York. Fotografia. Bumble Dee/Shutterstock.com
Nova York, EUA - 25 de maio de 2018: Multidão de pessoas perto da pintura de Pablo Picasso "Les Demoiselles D'Avignon" no Museu de Arte Moderna de Nova York. Fotografia. Bumble Dee/Shutterstock.com

A ideia era a de geometrizar e fragmentar as figuras, exibindo vários pontos de vista em um mesmo ângulo, transformando a noção de tridimensionalidade, representação tão almejada pelos renascentistas.

O movimento desenvolveu-sem em duas vertentes, a analítica e a sintética. No cubismo analítico, que perdurou aproximadamente entre 1908 e 1911), Picasso e Braque abusaram de cores sombrias como o preto, cinza, marrom e ocre, a fim de enfatizar as formas. Nessa tendência, a desintegração das figuras foi levada às últimas consequências, o que tornou os objetos irreconhecíveis.

Posteriormente, foi criado o cubismo sintético, com a finalidade de trazer novamente uma arte mais compreensível e figurativa. Nessa corrente, houve ainda a inserção de objetos reais nas obras, como pedaços de madeiras, vidro e colagens de letras e números. Por isso, esse estilo também é denominado Colagem.

Futurismo: a velocidade e agressividade como propósito

Destoando das demais vanguardas, o futurismo foi um movimento que exaltou uma ideologia calcada na violência, tecnologia, industrialização e dinamicidade.

Elaborado pelo escritor Filippo Tommaso Marinetti (1876- 1944), o manifesto futurista de 1909 era direcionado, primeiramente à literatura.

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O Dinamismo de um Automóvel (1913), de Luigi Russolo

Passado um tempo, houve a integração também das artes visuais, com Umberto Boccioni (1882-1916), Carlos Carrà (1881-1966), Luigei Russolo (1885-1974) e Giacomo Balla (1871-1958).

Esses artistas buscavam retratar a rapidez do mundo moderno, apoiando-se em ideias fascistas e cultuando a violência. Alguns integrantes da vertente, inclusive, uniram-se posteriormente ao partido fascista italiano.

Dadaísmo: a "anti-arte"

Com a ocorrência da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), exilaram-se em Zurique, na Suiça, alguns intelectuais e artistas que opunham-se aos horrores do conflito, repudiando a participação de seus países na guerra.

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Fonte (1917), de Marcel Duchamp

É nesse contexto, e profundamente descrentes do mundo em que viviam, que fundam um movimento com o intuito de exibir a perplexidade e o absurdo de seu tempo.

A corrente foi intitulada Dadá, termo escolhido ao acaso, quando o poeta Tristan Tzara (1896-1963) abriu um dicionário e pousou o dedo sobre a palavra, que em francês significa "cavalinho".

Assim nasce o Dadaísmo, que pretendia criar uma arte baseada em um pensamento livre e espontâneo, que via no acaso uma ferramenta para o processo criativo.

A principal ideia desses artistas era criticar e satirizar a norma vigente, que havia levado a Europa para um caminho de guerra e destruição. Portanto, a corrente não ficou restrita às artes, pois propunha uma mudança cultural e ideológica, denominando-se como "anti-arte".

Nas artes visuais, quem mais se destacou foi Marcel Duchamp (1887-1868). O artista francês causou alvoroço ao apresentar objetos prontos como arte, os chamados ready mades. Uma dessas obras é a famosa Fonte (1917), um mictório assinado com um pseudônimo e colocado em um salão de arte.

Quer se aprofundar no tema? Veja também Dadaísmo: contexto histórico do movimento que rompeu com a tradição

Surrealismo: a busca do universo onírico

O surrealismo aparece nas artes como um desdobramento da corrente dadaísta, no sentido em que busca também a oposição ao materialismo e racionalismo da época.

A Persistência da memória - óleo sobre tela, 1931 - Salvador Dalí, MoMa, NY. Kumachenkova/Shutterstock.com
A Persistência da memória - óleo sobre tela, 1931 - Salvador Dalí, MoMa, NY. Kumachenkova/Shutterstock.com

Essa vertente desponta em 1924 com um manifesto elaborado por André Breton (1896-1966). Eles defendiam o uso do automatismo psíquico como instrumento de criação, produzindo dessa forma obras com um caráter onírico, calcada no universo dos sonhos, das metáforas e do absurdo.

Salvador Dalí foi o artista que ficou mais conhecido nessa vertente, entretanto, houveram também Marc Chagall (1887-1985), Joan Miró (1893-1983) e Max Ernst (1891-1976).

Conheça também: as obras mais instigantes do surrealismo

Vanguardas na Europa: contexto histórico, motivações e características gerais

As correntes que despontaram na arte a partir da primeira década do século passado refletiam os ideais de sua época, marcada por profundas mudanças no mundo.

O contexto histórico foi marcado por inovações industriais, tecnológicas e científicas, assim como movimentos autoritários (o fascismo na Itália e o nazismo na Alemanha), além da Revolução Russa e da Primeira Guerra Mundial.

Nesse período houve um salto na estrutura capitalista e as desigualdades entre a burguesia e o proletariado se acentuam, fazendo com que movimentos por melhores condições de vida despontem, como, por exemplo, as organizações sindicais.

É nesse caldeirão de contradições e contrastes que os artistas estão imersos. Assim, naturalmente a arte produzida por eles é impactada por todas as angústias e questões do período.

Foi através de recursos estéticos inovadores que eles conseguiram transmitir novas ideias e exprimir parte da perplexidade que apresentava-se na sociedade vigente.

As vanguardas propuseram a fragmentação das formas, a arbitrariedade de cores, o exagero e o absurdo como formas de espelhar um novo mundo que estava nascendo.

Traziam um tipo de rebeldia, buscando ao rompimento com a arte tradicional e propondo um olhar totalmente novo acerca da arte e do próprio ser humano.

Literatura e as vanguardas europeias

A maior parte das vanguardas europeias teve destaque nas artes visuais, entretanto, algumas correntes também desenvolveram-se na literatura, e inclusive, algumas nasceram de manifestos literários.

É o caso do futurismo, que empregava substantivos aleatoriamente, verbos no infinitivo e onomatopeias, suprimindo ainda a pontuação.

O dadaísmo também teve lugar na linguagem escrita, sendo que o poeta Tristan Tzara aconselhava que para fazer um texto dadá era preciso que "o pensamento saísse da boca".

A literatura surrealista, assim como a pintura, também apontava para o mundo do inconsciente, e teve como representante André Breton.

Como as vanguardas europeias influenciaram a arte brasileira?

No Brasil, as vanguardas europeias influenciam fortemente as artes e a cultura a partir dos anos 20. Entretanto, anos antes houve um artista que já apresentava obras com características expressionistas, era Lasar Segall (1891-1957).

lasar segall bananal
Bananal (1927), de Lasar Segall

O pintor, nascido na Lituânia, viveu e estudou na Alemanha, vindo ao Brasil em 1913 para realizar uma exposição, acontecimento que marcou o modernismo nacional.

Em 1924 Segall se muda para solo brasileiro e passa a produzir telas com temática do novo país. O pintor foi o primeiro a trazer o frescor e crítica inerentes às vanguardas, de qualquer forma, era ainda um olhar estrangeiro, por isso, não foi rechaçado de maneira muito intensa.

A mesma coisa não ocorreu com a pintora brasileira Anita Malfatti (1896-1964), que, depois de estudar arte na Europa e influenciar-se pelas vanguardas, realizou exposições em 1914 e 1917. A última mostra foi duramente criticada pelo escritor Monteiro Lobato.

Tropical , 1917 , Anita Malfatti
Tropical (1917), de Anita Malfatti

Assim, a partir da repercussão negativa desses artistas, outros intelectuais passaram a se aprofundar em novas propostas estéticas vindas de fora.

Idealizaram então a Semana de Arte Moderna de 1922, evento no qual exibiram suas produções com inspiração nas correntes estrangeiras, mas com um olhar voltado para temas nacionais. Tais obras abarcavam tanto as artes visuais como a literatura e até a mesmo a música.

Podemos citar como personalidades que se sobressaíram nesse momento e nos que se seguiram: Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Di Cavalcante, Tarsila do Amaral, Vicente do Rego Monteiro, Menotti del Picchia, dentre outros.

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Laura Aidar
Laura Aidar
Arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Licenciada em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formada em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design.